domingo, 13 de março de 2016

KEEP IT SPIRITUALLY SIMPLE :)



Gosto do principio K.I.S.S.; Keep it simple stupid, mantem as coisas simples, tolo. Eu mudaria, neste contexto para, Keep it spiritualy simple; mantem a simplicidade espiritual. Dogmas, caixas, rótulos e fórmulas podem ser interessantes e de inicio uma util ferramenta ou muleta- ainda que na verdade dispensavel, mas podem ajudar. No entanto não é saudavel, practico ou muito propiciador de serenidade e felicidade se obcecamos no que é acessório em detrimento do que é essencial. Senão parecemos como o homem que vai todos os dias a fisioterapia com a sua bengala e mesmo depois de recuperado não sai de casa sem encontrar as muletas. Discernimento e bom senso sim, muralhas e muletas não. A muralha que hoje elevamos para nos proteger cedo pode se tornar no nosso auto proclamado cárcere e a muleta que hoje pode ajudar a andar, amanhã nada mais é que um entrave ou redundância reflexo de inseguranças próprias infundadas mas perpetuadas.

Todas as criaturas viventes têm em si algum grau de mediunicidade- como Allan Kardec já o ensinava e antes dele Eliphas Levi, Agripa e até Platão, ou Jesus, Buda, etc. Mediunicidade sendo a capacidade de se posicionar no meio, no entre mundos, naquele promontório onde o véu é mais fino e a comunicação é mais perceptivel. O quanto temos de tal capacidade de comunicar tem mais a ver com a nossa postura que com capacidade escolástica. É mais sobre dignidade de intento e compaixão posta em acção para connosco mesmo e com quem nos rodeia. Se não sabemos comunicar - não apenas falar, connosco mesmos e/ou com os que de carne e osso nos rodeiam, dificilmente entenderemos o que está a ser dito duma forma não muito distante ou mesmo complicada mas sem duvida mais ténue e mais serena.


A maneira como aprendemos a usar os sentidos (os fisicos tanto quanto os de percepção extrasensorial), ou de outra forma, como crescemos os "musculos espirituais" é muito semelhante em verdade a como desenvolvemos os musculos fisicos. Uma boa nutrição, um exercicio fisico geral para activar a circulação, seguido de exercicios e repetições especificas, muita hidratação, evitar substâncias intoxicantes, buscando conselhos de quem já sabe e practica- de vários, para poder ver o que se encaixa melhor a nós. Notem, não o que encaixa na nossa area de conforto ou pre-fabricados conceitos, mas o que ao mesmo tempo que nos estica e força sair  de zona de conforto e impele a fazer, por exemplo, mais uma repetição de agachamentos ou prensa de peito até que não desfalecemos mas temos aquele ardor bom de estar a "puxar" pelo corpo. Cada um tem seu metabolismo, por isso para uns funciona otimamente uma dieta paleo, noutros uma vegetariana suave, outros vegan, outros com possibilidade de uma certa indulgência da carne- sem se tornar gula ou lá engordamos em vez de crescer musculo. Exercitar os biceps pode ser feito de várias formas e com varios nomes- o que importa é que se estamos a nutrir-nos (não apenas alimentarmo-nos), a esforçar, a testar meios e a nós mesmos, se no fim resulta- pouco importa o nome que lhe deram. 

Espiritualmente, podemos - e pessoalmente encorajo, ser avidos leitores de conhecimento teosófico (theos=divino; sophia= conhecimento), não apenas ouvir mas ir buscar fontes. Ler a biblia pelo menos uma vez na vida capa a capa - o velho testamento é o fundamento das 3 maiores religiões do mundo nos ultimos 2500anos (o abraamismo que se divide em judaismo, cristianismo e islamismo). Podemos ler os livros new age claro, mas buscar as suas fontes e a bibliografia dos que os escreveram. Sempre indagar não como uma criança teimosa mas como uma criança ávida de aprender e eternamente na idade dos porquês. A serenidade não vem duma meta final de absoluto conhecimento- que não obteremos neste estado, mas da caminhada em si estar a ser feita e que o seja pelo motivo mais nobre possivel- a iluminação própria e a dos que nos rodeiam.

Interessa-nos ou ressoa em nós a cultura judaico-cristã? Leiamos a interpretação mistica da mesma, não só a letra rigida e censurada pelos séculos. Podemos ler Eliphas Levi, Agrippa, Pistis Sophia, Livro de Enoque, Chave de Salomão, etc. Ressoa em nós algo mais por culturas pagãs, celtas ou nordicas? Podemos começar por Gerald Gardner, Doreen Valiente, Scott Cunningham, Ann Moura ou outros que ao criarem a Wicca já foram buscar muito do conhecimento antigo e depois acrescentaram o seu cunho/interpretação. Se adeptos ou apenas curiosos duma visão mais aprofundada e não ortodoxa porque não ler Alistair Crowely, Madame Blavatsky, Nicholas Roerich, Allan Kardec, Chico Xavier, etc.

Mas não temos de ficar por ai, na verdade se algo de uma vertente nos ressoa por empatia intelectual ou espiritual presente ou algo pressentido, uma familiaridade que talvez nem seja desta vida, podemos e faz sentido ler o que foi antes, muito antes. Ler "O Livro de Caminhar para o Dia" (vulgo "Livro dos Mortos" egipcio") , O papiro egipcio de Ani, o Bardo Thodol tibetano, Os Eddas nórdicos, o Épico de Gilgamesh súmerio/babilônico, os Upanishads e Vedas hindus, Os manuscritos das 5 pérolas do budismo, O codex de Dresden acerca dos Mayas, as crónicas de Julio Cesar sobre os celtas da Europa continental, as crónicas dos Indios Hopi, o Kebra Negast da Etiópia, etc etc. Quanto mais antigo o livro mais probabilidade de ser um relato real do que se practicava- mesmo que algumas das prácticas e premissas não se adequem aos dias de hoje mas obtemos um conhecimento concreto e acima de tudo a clara percepção da transversalidade de muitos temas, histórias, lendas, criaturas, ritos, até arquitectura através das eras e continentes.






Contudo, por mais que eu pessoalmente tenha lido tudo o que acima listei e mais, não creio de todo que seja isso que aumenta a mediunicidade ou a espiritualidade de alguém, muito menos a dignidade interior. Pode ser interessante, pode nos ajudar a apreciar quem já passou pela mesma Peregrinação que nós mas não é senão um acessório.

Da mesma forma os rituais realizados e objectos utilizados ou roupagens e reliquias ou amuletos são ferramentas auxiliares fisicas para estimular um corpo fisico a atingir um "mood" mais propicio a experienciar a espiritualidade- não são um fim em si mesmos nem o poder está intrinsecamente nestes. Tudo isso serve apenas para uma unica coisa: satisfazer e estimular os sentidos fisicos que enquanto seres mortais ainda temos. Não é indispensãvel acender uma vela, acender um incenso, cantar um hino , recitar um mantra ou acertar na quantia precisa de sal grosso e plantas para ter resultados. Tudo isto é como que um teatro que pomos para a nossa propria mente consciente, para que pela visão, olfacto, sabor, tacto e escuta, a parte consciente, lógica e carente de ver gatilhos lógicos em tudo, seja não manipulada ou controlada mas saciada de modo a deixar passar à frente a parte subconsciente e junto deixe se fazer ouvir a própria alma ou coração.



Por isso se vos ajuda acender um incenso antes de orar, se vos ajuda recitar um mantra para deixar a mente relaxar e focar em algo, se vos ajuda a sentir melhor uma  canção ou hino, força. O propósito é acalmar os impulsos do corpo e acentuar, trazer ao de cima a sensibilidade interior. Se por outro lado não dispoem de uma vareta de incenso, ou não podem acender uma vela onde estão, se não sabem um mantra, se tomar um banho de sal grosso ou desenhar um circulo no chão vos faz sentir tolos , não o façam. Cada um tem diferentes pontos de sensibilidade, cada um tem uma "grossura de pele" diferente - e que varia ao longo da vida. Se algo vos ajuda a ficar num "mood" mais sereno, receptivo e positivo- ótimo. Relembro a frase lema do Gerald Gardner, conhecido "Pai" do revivalismo do neopaganismo nos nossos dias: "E sem ferir a ninguém, faz como te aprouver". Aqui relembro que nós somos alguém, sem ferir a nós mesmos, aos outros e a nenhum animal ou planta. Mas se não têm um objecto, aquele deck de tarot, aquele athame, aquele incenso "just right"... não "paniquem". Tudo isto é acessório, não deixem que o acessório se torne compulsivo ou uma bengala sem a qual não saibam ou não queiram se mexer no caminho da própria serenidade e iluminação.

Conhecimento, instrumentos, objectos, velas, incenso, mantras, podem ser de utilidade SE E SÓ SE a obtenção dos mesmos é feita com honestidade, humildade e simplicidade de quem percebe que o importante é a meta de se sentirem bem, serenos e na "frequência" que precisam para sentir mais próximos e disponiveis para um aprendizado espiritual. Stressar a procura em varias lojas por "aquele" incenso ou a gastar dinheiro que precisam para comer aquele livro fantástico ou repetir um mantra á exaustão só porque sim ou porque alguém do lado vai achar estranho se o não fizerem... bem só prejudica na verdade.

Sei por experiência que o que é realmente essencial acaba por aparecer - quando a intenção é certa e existe uma necessidade. Se não surgir é porque não era necessário ou talvez porque alguem nos esteja a tentar mostrar que ao focar no acessório amiude perdemos noção do essencial. Uma pessoa rodeada de livros e incenso, velas, japamalas e cruzes pode estar tão preparada para fazer um exercicio de"musculação espiritual" quanto uma pessoa sentada, cabelo desgrenhado, em calças e camisa simples de olhos fechados em silêncio e de mãos vazias- desde que o coração e a mente estejam na atitude certa: a busca pela Sabedoria, pela Compaixão e pela Luz, para si e para todas as criaturas viventes.




Aos olhos de quem nos vê do outro lado do véu, acredito e por experiência falo, estamos todos nus e os nomes dos arquétipos que evocamos significam algo apenas para nós que ainda precisamos de dar nomes e relacionar com algo que conhecemos ou sentimos empatia com esta ou aquela faceta. Chamem-no anjo da guarda, guardião, amigo, um nome especifico, uma divindade...ele/ela está lá na mesma e responde não porque acenderam o incenso certo, o mantra pronunciado imaculadamente ou evocaram um nome que em si tem poder. Quem connosco fala- e tantos tentam constantemente pelas mais variadas razões, vêm isso tudo como muletas nossas- dos mortais limitados por dogmas e sentidos fisicos que podem carecer ser mais ou menos estimulados para sentir-mo-nos seguros; para eles o que importa- piroso ou "old school" que possa soar, sempre foi, é e será o coração. Não apenas no momento mas o coração em acção, os pensamentos, palavras, acções e omissões que cometemos para nós mesmos e uns aos outros esses sim criam barreiras ou abatem-nas. Vem tarde, vem cedo, vem de tunica, vem de calças, vem a cheirar a sandalo ou a suor do fim do dia de trabalho, vem com um japamala, uma cruz ansata, um pendente de ametista ou um pescoço desnudo, não importa a quem está do outro lado, aqui mesmo ao lado. Vem limpo por dentro, vem humilde, vem atento, vem mesmo que com algum cepticismo- ceptico não é descrer de tudo é querer entender por si as coisas e não apenas seguir porque sim. Vem a teu tempo, vem como és, vem como quem queres ser, vem limpo e nunca encontrarás uma porta fechada junto de quem te quer bem, deste ou do outro lado do Véu.

sexta-feira, 4 de março de 2016

A DIMENSÃO ESPIRITUAL DA DEPRESSÃO




      Este é um tema que se calhar alguns vão torcer o nariz. Na minha própria família as vozes são muitas a dizer que psicologia não é ciência e que espiritualidade é um manto de conforto do ego.
     Como um ex sacerdote e um ávido estudante multidisciplinar, discordo de ambas frases. Ainda que entenda que por vezes a psicologia é aplicada como se fosse uma equação simples quando tem múltiplas constantes e variáveis- nada nem ninguém é unidimensional ou de leitura simples e direta por um só factor - isso é preconceito não psicologia.
     Quanto a espiritualidade, para mim, é uma busca incessante pelo Divino, pelo conhecimento, companhia e emulação das qualidades que cremos nos farão felizes, mais em paz connosco e com os outros e uma mais-valia para o bem comum. Isto, de forma alguma, é um processo de conforto, exige ginástica mental, uma perpetua mas estranhamente serena inquietude, uma adaptabilidade sem prescindir da faceta inquisitiva.
A razão de falar destes dois pontos é porque enquanto alguém a recuperar dum colapso nervoso, encontro-me na fase de nem ter tristeza ou pensamentos taciturnos, apenas uma estranha apatia. Seja por coisas simples como comer, dormir, a coisas mais complexas e de distração como filmes, musica, livros, mas também passando pela ausência de paixão com uma quase sensação de assexualidade.
     Há um ponto na depressão e colapso nervoso em que cataclismo é a palavra certa, há dias em que saio e a meio caminho de algum lado me esqueço como ali cheguei, onde estou e o que ia fazer ou por exemplo demorar muito tempo a processar informação básica de segurança, de entender um semáforo ou de ler um preço. Não me tornei cego, iletrado ou estupido do dia para a noite. A informação entra, é processada, mas não devolve resultado imediato.
     A sensação que tenho é a de estar a vivenciar um cataclismo de caos na mente e ao sintonizar a rádio do bom senso empírico e logico assim como a sensibilidade espiritual, só ouvir estática. Sei com todo o meu ser que há algo e que está a tentar me indicar algo mas é como se tivesse ficado surdo ou perdido o botão de sintonização e fiquei preso na estática. As instruções estão a ser dadas eu é que não as estou a entender, de todo.
     Isto para dizer que na minha incompleta, falível, ignorante opinião, acredito que parte de depressão- certamente no meu caso, não é só um desequilíbrio químico no cérebro ou conceitos erróneos enraizados no subconsciente, mas uma parte da mim, da alma, que se está a dividir. Parte de mim é como se nem cá mais estivesse e a sensação nem é tristeza é um vazio ou eco que tenho dificuldade em encontrar a fonte. Como se tivesse sido chamado tanta vez para outro lado e outras coisas que a dado ponto parte de mim já não está em mim, uma sensação extrema e no meu caso aqui e agora quase paralisante (mental, emocional e por vezes fisicamente) de o meu corpo estar no lugar errado, de ter virado numa "esquina" errada e estar cada vez mais longe de onde deveria estar.
     Penso, possivelmente errado bem sei, se depressão não é às vezes a pessoa que somos aqui e agora a atingir um cúmulo de possibilidades e incompletissitude por não estarmos a seguir um outro rumo de escolhas que levar à pessoa que deveríamos ser.
     Tendo tido alguma experiência no campo da espiritualidade e tendo passado por vários episódios que por mais céptico e racionalista que me tenha tornado não consigo justificar, vejo esta apatia, este presente frio e surdez com apreensão. Cheguei eu a um ponto tão oposto ao que deveria ser que me tornei estanque? Terei criado tantas barreiras subconscientes por medo de rejeição, por uma imagem distorcida de valor próprio, por necessidade de controlo de contexto como meio de segurança que me tornei surdo do bom senso, cínico do que sei ser real e colocado um muro onde antes me foi levantado um Véu?
     E se sim, o que será preciso para acordar-me se nem eu mesmo sei? É difícil encontrar a porta de saída quando estamos às escuras e nos esquecemos de onde pusemos a vela...
     Entendo agora melhor que nunca que por vezes a obstinação, o empedrecimento de um caracter, o esfriar de um coração e cacofonia espiritual não advém nem de súbito nem necessariamente por vontade consciente. Às vezes é sub-reptício e como consequência duma cadeia de eventos e escolhas em que escolhemos o que é seguro em vez do que sabemos ser certo, em que buscamos encaixar a nossa personalidade na visão que outros têm de nós ou do que acham que deveríamos ser. Um misto de vergonha e ingratidão permeiam-me e, ainda que não me paralisando de culpa ou confusão "per se", levam-me a perguntar a mim mesmo: O que é que o meu coração, a minha alma no seu mais profundo, me está a tentar dizer que eu ainda não entendi?

Parte de mim sabe uma pequena parte da resposta mas admito, tenho medo. Estupidamente, vergonhosamente, duma forma como não o era toda a minha vida até um par de anos atrás, tenho medo de ser eu mesmo. Parte por abuso verbal e mental externo que estranhei mas deixei entranhar até acreditar, parte por ter cedido a pressão duma máquina de apatia e mecanização das emoções a que chamamos sociedade em que me tornei como que num hamster que corre desenfreada e estupidamente na sua rodinha por um pedaço ínfimo e queijo no outro lado da grade quando a porta entretanto já foi aberta mas não soube "formatar" o condicionamento de viver para sobreviver, para pagar contas, picar ponto, servir, perdoar e permitir tudo porque assim não magoo nada nem ninguém...menos a mim mesmo.
Por isso aqui estou as 6h00 da manhã, tendo chegado a casa perto das 4h depois duma noite de excelente companhia de 2 bons amigos e uma nova amiga em que falamos de espiritualidade e fizemos alguns procedimentos em que sempre, MAS MESMO SEMPRE, tudo o que vinha no meu sentido eram palavras-chicote (como quando ouvimos verdades dificeis mas que precisamos de as ouvir) fosse de quem não em conhecia diretamente ou pelos processos usados. Sinto alguma validação, como se parte do meu coração me estivesse a sussurrar, ainda não livre mas algo mais leve "Eu tinha-te avisado, já tínhamos falado sobre isto..."

Mas isto também é crescer e partilho mesmo que saiba que alguns possam achar que é over share, primeiro porque tenho o instinto de o partilhar e calei os meus instintos erradamente por muito tempo e segundo porque espero que se alguém ler e se identificar e com isso contribuir para o bem, acreditem, far-me-á muitíssimo feliz - e não preciso de o saber agora nem amanhã.
Há acasos, coincidências, sorte? Não sei, talvez, as vezes, enquanto não vemos "the big picture". A minha experiência e conclusão são de que coincidências são uma forma de anonimato dum conjunto de fatores e entidades que nem sempre é doce, fácil ou compreensível mas sempre tem um sentido. Não me refiro às maldades que fazemos uns aos outros ou à morte prematura de alguém ou algo assim, mas ao timing, o enquadramento geral em que sucede o que nós por livre arbítrio individual despoletamos. As coisas não ME acontecem, as coisas acontecem, e eu serei um produto do meu contexto tanto quanto de como escolho encará-lo.
Onde quer que estejam, qual seja o vosso contexto, espero que estejam bem, que se a vossa mente e coração tem caminhado como o meu por lugares sombrios e frios, acreditem e, como estou a tentar, se levantem, arregacem as mangas e trabalhem para sair desse túnel - porque nem todos tuneis têm uma luz ao fundo, escavemos uma saída, encontremos a vela e sigamos para ser o que devíamos ser, o que podemos ser, o que queremos merecer ser: felizes, iluminados, uteis, plenos, livres. Bem hajam e abençoado seja o vosso dia por esta singela paciência e cumplicidade de "me ler". Sejam felizes :)

 

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

ESPIRITUALIDADE & MISTICISMO: ILUMINAÇÃO OU CONFUSÃO?



Uma das coisas que rapidamente me apercebi deste muito cedo na vida foi que, independentemente do valor intrínseco ou mesmo do potencial de cada vertente de filosofia teológica ou religião, há águas que não se misturam sem por em causa a integridade das mesmas. Há misturas que são contrassensos por terem premissas de raiz que não permitem acomodar uma compatibilidade plena ou, por vezes, mínima. Um abraâmico (judeu, cristão ou muçulmano), por exemplo, se ortodoxo, nunca poderia acreditar piamente num oraculo, método de adivinhação ou numa salvação através de conhecimento e compaixão somente porque algumas das premissas fundamentais de tanto judeus, cristãos e islâmicos é a noção de mácula à nascença, de propensão inescapável do ser humano para cometer atrocidades, da necessidade imperiosa de uma escala hierárquica e de uma casta sacerdotal masculina restrita, a solução de todos os problemas está encompassada nas palavras e atos dos seus guias e profetas oficiais e de mais ninguém- nem mesmo dos praticantes "normais".
Existe uma necessidade de entrega emocional, mental e física a um Deus que se auto revela como "invejoso", "ciumento", "rápido em cólera e castigo" para quem consulta ou tenta saber de algo sem ser através dos profetas e todas as vertentes possuem (judaísmo e cristianismo com um afã mais claro) uma distinta noção da absoluta indispensável necessidade de um ser divino, um Messias, que expie e redima a humanidade sem a aceitação do qual e seus preceitos de nada vale qualquer grau de compaixão, inteligência ou obras. Uma outra noção clara é a de monoteísmo acérrimo, nem os próprios profetas podem ser adorados; respeitados com certeza mas não adorados. 

 

O primeiro dos 10 mandamentos é precisamente a ordem de não adorar mais ninguém de todo. Judeus não ortodoxos veneram uma contraparte feminina de Deus, na cabala - ora isso já não é a religião israelita, nem o uso de numerologia, astrologia, misticismo das letras do alfabeto e outras "artes" como meio de obter conhecimento oculto através de artes divinatórias que são apenas pálidas cópias do que antes os seus vizinhos da Babilonia e Egipto tinham. Um israelita ou judeu, ou um cristão ou um muçulmano que venerem qualquer pessoa ou entidade (santos, anjos, etc.) para interceder junto de Deus e a quem façam promessas estão por defeito já a quebrar o primeiro mandamento. Se o fizerem fazendo oferendas de velas, incenso e/ou comida e/ou promessas de caminhadas, dadivas etc. para a realização duma tarefa divina para ultrapassar um obstáculo estarão a quebrar o primeiro mandamento e o mandamento da idolatria também.

Porque as pessoas têm vontade própria e alguns não se acomodam em submeter a vida toda à "letra da lei" nem as decisões de um só homem, começaram a olhar a volta e para o seu próprio passado e começaram a praticar o que não pode ser chamado de outra coisa que não paganismo e magia mas para não serem descobertos ou sancionados, mesclavam princípios dúbios da sua religião que era e é restritiva com invenções puras e apropriações culturais de modo a justificarem a outros e a si mesmos que o que fazem ainda tem lugar dentro do espectro ritualístico da confissão religiosa que seguem
Para ser prático e claro, alguns por exemplo acendem velas ao fazer um pedido a Deus ou aos santos. Este hábito nada tem a ver com a bíblia- de todo, é uma apropriação dum hábito religioso grego e romano. O uso de incenso na bíblia era para quando faziam sacrifícios de animais para disfarçar o cheiro e ser um símbolo de oração- o fumo a subir ao céu como as suas preces. Passou a ser usado nos altares, nas casas e quando se fazem pedidos por apropriação cultural de rituais da Babilónia e Egipto. A adoração de Maria é dos mais claros pontos de um povo a querer voltar aos tempos do paganismo onde havia a figura de uma entidade Maternal poderosa- algo que não apenas é omisso da bíblia mas é específica e claramente proibido. A par disto em lado algum, bíblia ou qualquer registo, ate o século II depois de Cristo, se falara de Maria com qualquer aspeto místico, de seu nascimento só sabíamos a linhagem

 

Assim que uma pessoa hoje ir a uma meditação de estilo budista e querer comunicar com o Alem através de tarot ou outros rituais, pedindo a intersecção de santos ou por exemplo de Saint Germain (que não foi um santo cristão, de todo, foi um assumido místico primeiro aparecendo no seculo 18 e nunca pregando nada apenas agindo e falando do que aprendera no oriente e de como achava a metodologia e teologia ocidental perigosamente castradora da mente e espirito, ocasionalmente engajando em rituais abertamente pagãos com laivos de budismo) ou de evocar anjos ou arcanjos (cujos nomes foram inventados como arquetipos muito depois da bíblia, surgindo em escritos os mais antigos do seculo IX de forma rudimentar e como os conhecemos hoje só haveriam de ser escritos no seculo XVII, sendo que na bíblia se adverte que não se pode evocar nada nem ninguém, nem um profeta os deve evocar porque Deus é o senhor dos anjos e não o mortal e o deus bíblico nunca mencionou nomes sem ser de 3 e não há na bíblia menção a títulos dos mesmos. Essa pessoa não pode por coerência querer misturar tudo e se sentir congruente nem muito menos cristão ou israelita.
As coisas têm nome. Uma pessoa que misture de tudo um pouco será um curioso, um aventureiro a tirar algo de uma cultura e outra coisa de outra. Não é mau nem é bom. Interessa é duas coisas: ´
1-      Quais os critérios seguidos? Um estudo a biografia dos autores de tais formas de pensamento e rituais tende a mostrar que agiam e escreviam- como é o caso de Eliphas Levi ou Agrippa, com um elevado grau de amargura face a liderança da igreja de onde foram expulsos mas também não plenamente conformados com a religião para onde foram se converter. Estes dois que mencionei misturam bíblia com misticismo cristão dos gnósticos com cabala da mística judaica com uma interpretação muito própria - e em ambos casos muito patriarcalista e adepta da necromancia, de forma algo confusa e contraditória e sempre mencionando que obtiveram conhecimento de livros ocultos cujos títulos e autores nunca mencionam ou de anjos que só eles viram.
2-      Porque devo eu hoje, ou quem quer que seja, aceitar sem questionar que alguém misturou tudo a sua forma? Ademais se essa pessoa nem assume, ou as vezes sequer sabe, que o que diz pode ser muita coisa mas não é um ensinamento milenar nem muito menos monoteísta ou bíblico? Posso até acreditar e ver valor em alguns métodos e interpretações dum caminho ou de outro, mas irei sempre averiguar onde e como foi obter esse conhecimento. Isto não é ser teimoso ou céltico demais- eu ademais acredito na possibilidade de divindade, mas antes é um salutar desejo de conhecimento, de independência intelectual e espiritual

 

Chego a ver pessoas seguirem um caminho- ou a criá-lo, misturando a bíblia, cabala, livros de autores de caracter altamente dúbio do seculo 19/20 pertencentes a ordens de secretismo como Rosa Cruz, ordem do Templo, Ordem de Telema, Ordem da Manha Dourada, etc, misturar com restos de tradições orais de folclore místico da eurásia, inventando rituais e sem qualquer fonte comprovável afirmando ser de origem celta ou sul ameríndia, alegar ter acesso a conhecimento de continentes e pessoas desaparecidas, misturar isto tudo ainda mais com ficção cientifica e alegar existirem federações intergalácticas espirituais onde estão jesus, buda, Vishnu e outros (curioso que a parte de ficção cientifica New age é composta quase sempre só de homens e ademais todos ilustrados como brancos e louros...) indo ao detalhe de dizer a cor das fardas e que é quase igual ás do Star Trek.
Parece brincadeira? Mas não é, há pelo menos 6 correntes "espirituais" principais que eu conheça assim neste momento em franco crescimento e é delas que advém muitos livros ou de seus acólitos que depois saem e acrescentam ainda mais coisas e pontos e personagens e rituais. Os únicos 3 pontos comuns a vastissima maioria destes místicos adeptos da mistura cultural e ideológica?
1-      Nunca há bibliografias ou fontes nos seus escritos com mais de 50/80 anos;
2-       A solução para todos os problemas é o coração, a alma, a luz mas sempre de forma vaga e, a meu ver, irritantemente dogmática in extremis;Com um pendor para atribuir a todos um sentimento de perseguição; há sempre invejas, maus olhados, energias negativas e trabalhos feitos que só ele/ela pode ajudar e de bom coração o fará...pelo preço certo. Se passar, o mérito é de quem mandou fazer o ritual e pega-se a pessoa num ciclo, se não funcionar é porque Deus o não quis ou a pessoa foi fraca e tem de fazer mais sessões- pagas é óbvio. Nunca se fala em os problemas terem de ser enfrentados com maturidade, ser assertivo, ser bondoso, se alguem mesmo inveja- da a outra face e ignora, faz voluntariado, ajuda os pobres (em principio o que melhor limpa a alma é fazer o bem mas isto nunca é recomendado- desvia o foco da pessoa), obter apoio psicológico (porque perturbações mentais profundas como esquizofrenia paranoide, bipolaridade, ou mesmo depressão não passam com rezas, meditação ou rituais pagos- sem desmerito a validade possivel da oraçao ou meditação ou ritual mas TEM de haver cuidado com o que se diz e apontar a pessoa para cuidados médicos profissionais, para lidar e não apenas fugir ou negar a existencia de problemas)
3-      Fazem-se pagar e bem pelo conhecimento não rastreável de rituais não explicados. Quando digo fazem-se pagar bem digo pedirem uma média de 50euros para uma meditação ou 50/100euros por uma leitura de um método de adivinhação seja tarot, runas etc, ou rituais de limpeza da pessoa/casa por 100/200euros; formações ou seja ensino de princípios alegadamente libertadores por nunca menos de 250euros por 8/10horas sem haver bibliografias, explicação histórica, biografia de quem desenvolveu ou contribui para tais métodos, um lado mais pragmático e especifico e personalizado e NUNCA uma formação que seja tão extensa que exponha tudo mas que diga apenas o que se quer ouvir de forma vaga, não vinculativa, fantasiosa q.b. para despertar curiosidade mas nunca pragmática ou completa q.b. para que a pessoa numa só sessão possa ter dados para formar uma opinião do todo e muito menos ser capaz de se sentir um praticante pleno (para isso tem de ele/ela mesmo ter outra formação de iniciação ou formação de formadores- a serio isto existe, por uma media de 500/800euros por um período que pode ir de 8horas a um par de meses)

 Nem vou pelo se resultam ou não porque a meu ver onde há crença e energia suficiente acaba por haver um dobrar de campos mórficos e pode se influenciar de facto a balança das probabilidades mas seja de que vertente seja porque não é o nome ou ritual ou instrumento que faz a alteração é a eletricidade/energia dos praticantes que desbloqueada e canalizada por que meio seja pode de facto fazer as mudanças
Chocados? Bem, eu fiquei e desanimado porque uns praticam e fazem estas coisas com convicção - não retira a mancha que poem em si mesmos de ingenuidade e preguiça mental de não irem investigar a fundo o que eles próprios alegam, mas entristece. Por outros sinto alguma estranheza; nem é repulsa ou raiva, é estranheza; como podem passar o que acreditam ser um meio de libertação espiritual ou meio de contribuir para a felicidade e iluminação de alguém e fazer-se cobrar de modo a manter estilos de vida de luxo? Até entendo que cobrem- não concordo a maioria das vezes, mas entendo que pode haver vantagens em se abstraírem do mundo normal para servir uma causa ou chamamento- mas a causa ou chamamento deve ser a espiritualidade, a Luz, o bem-estar emocional, físico e espiritual de todos... Não o chamamento duma casa luxuosa, um Ferrari a porta ou viagens de luxo, sensualidade desenfreada e egocentrismo encapotado de falsa modéstia

Agora uma confissão muito pessoal que se calhar chocará ademais pelo que escrevi há pouco
Desde os 8 anos que tenho episódios menos normais ou explicáveis pela ciência como a entendemos hoje- embora para mim tudo é ciência apenas a operar sobre leis que ainda não entendo embora tão mensuráveis e reais quanto a lei da gravidade ou de campos magnéticos, da termo dinâmica, etc. Já raciocinei e raciocino tantas vezes o que me sucede desde criança mas facto é que é a minha realidade, é para mim facto assumido de que há algo mais do que consigo explicar ou (por vezes) empiricamente provar. A minha infância e juventude foram marcadas por vários episódios que poderiam pelos mais conhecedores destas coisas do misticismo ser apelidadas de paranormais. Fui sacerdote, aos 19 fui sacerdote de Melquisedeque, aos 22 fui ordenado sumo sacerdote de Melquisedeque, impus as mãos sobre centenas de pessoas- literalmente, para dar bênçãos de conforto, saúde e orientação e, quando assim sentisse, falar o que via para além do físico- fossem coisas passadas, presentes ou potenciais. Não há futuro na pedra mas há coisas mais prováveis que outras e por vezes, sim, acredito, é possível ver o que pode vir a acontecer se o presente curso de escolhas não for alterado. Sai da igreja que me formou porque aprofundei conhecimento a ponto de já encontrar mais incongruência que conseguia comportar e menos humanismo e compaixão pura do que gostaria. Sai aos 24.
Nos últimos 14 anos tenho estudado os Vedas, Puranas, Upanishads, Al Corão, cabala, livros gnósticos, Épico de Gilgamesh, Papiro de Ani, Livro de Caminhar para o Dia (nome real do Livro dos Mortos), muitos tratados de filósofos, místicos e historiadores antigos desde os mais clássicos a Plutarco, Heródoto, Plínio, Asclépio, todos os Hipocefalos que encontrei, o Popol Vuh maia, o Códex de Dresden, Escritos de jesuítas e cistercienses que coligiram a tradição oral das crenças ameríndias e Aborígenes do pacifico, o Bardo Thedol tibetano, as cronicas e mitos de Erishkigal e outros da Suméria, relatos de Júlio Cesar acerca dos celtas (eles não tinham escrita e é um risco agridoce ler o que o vencedor escreve), livros de seculo 18 e 19 de coletâneas de tradições eslavas e nórdicas (um dos meus preferidos é "The Golden Bough" que recomendo vivamente a quem quer ver como tudo se interliga e como uns emprestam a outros suas crenças ou suas repulsas), Allan Kardec, Chico Xavier, Madame Blavatsky, Aleister Crowley, John Dee,  etc.
Até li historia e proto-história, lendas de culturas e monumentos e religiões desaparecidas, culturas alegadamente iluminadas subterrâneas, astronomia, astrologia (lendo tratados de desde cerca de 500 A.C. ate a idade média), ufologia e física quântica. Movido pelo meu gosto por medicina não convencional e pelo meu estudo e gosto pela cultura europeia pré cristianização, busquei (e não foi fácil encontrar livros sérios com estudos e bibliografias) herbologia, litoterapia, reiki, etc. Busquei também obter bases de paganismo, totemismo, animismo, xamanismo, neo paganismo, Wicca, misticismo New age, 7 raios de luz, gerações de luz (crianças índigo, cristal, etc.), personalidades chave no misticismo New age (St Germain, etc.) numerologia, misticismo dos alfabetos, simbologia maçónica (essa que aprendi na igreja que frequentei na adolescência e inicio de adulto), feng shui, budismo, etc sempre com livros o mais antigos possíveis- mínimo de 150 anos, mas o ideal com bem mais. Procurei conhecer não só métodos de comunicação com o outro lado, vulgo divinação ou adivinhação, mas a sua historicidade, antiguidade, autores, buscando quem escreveu sobre isto antes e antes e antes e em que contexto, ai aprofundou um pouco mais sobre astrologia, cartas (tarot e oráculos), necromancia, I-Ching, runas, pendulo, radioestesia, necromancia, palmestria, etc.
No fim de tudo e com tanto por percorrer ainda não sei o que pensar. Não sei acerca dos caminhos- uns vejo como mais práticos outros muito como quem quer dizer o que se quer ouvir- facilitismo ideológico é um chamariz para paralisia intelectual e entorpecimento emocional e da vontade própria. Por outro lado, os episódios menos cientificamente explicáveis continuam a suceder na minha vida e a sensação de chamamento ou vocação é tão forte hoje em mim como o foi aos 8 anos de idade. Estou a tentar elaborar algo que seja uma experiencia de escape e veiculo para mim mas que seja para o beneficio real espiritual, emocional, psicológico e se possível físico dos que me rodeiam tanto quanto o meu.

 
Esta ultima parte de confissão é para que entendam que não desdenho praticantes ou ideologias, apenas acho que seremos mais livre, felizes e- a meu ver, iluminados, se quando face a algo (seja no campo emocional, psicológico ou psíquico/espiritual), formos um pouco mais inquisitivos, mais auto didatas, mais mente aberta sem dúvida alguma mas sem ceder de certas "guidelines"
1-      Um terapeuta ou sacerdote ou o que lhe chamemos pode propor escolhas difíceis, dizer algo que não entendemos no momento, magoar ate porque as vezes ser direto magoa, mas NUNCA pode ser alguém que nos prende a si nem nos faz pesar a consciência, a carteira ou a dignidade.
2-      Fazer aos outros como queremos que façam a nós- NUNCA esquecer a importância de ao seguir um caminho ou buscar por um, de apoiar todos os que nos rodeiam; sem complexo de mártir mas também sem ser agiotas ou apáticos. Se o que fazemos agora é aberrante face ao que buscamos como destino final, então não é logico, benéfico ou real
3-      O propósito de toda a criação, a meu ver, é a felicidade; se um caminho ou pessoa (incluindo nos mesmos) não esta a contribuir para a liberdade intelectual, maturidade emocional, perda de medos e complexos, se não ajuda a aumentar a auto estima e baixar o ego, se aponta mais diferenças que semelhanças entre as pessoas, se propõe divisão e preconceito e não pontes, então não é, por raiz, algo Iluminado, Bom ou Divino

 

Obrigado pela paciência em ler este pobre ignorante que tem de aprender a resumir as ideias de forma mais curta e pertinente. Bem hajam e sejam felizes :)

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

A VIAJEM DA ESPIRITUALIDADE



  

Primeiro, permitam-me explicar o que isso significa para mim, porque é ou aparenta ser algo de interpretação infinita. Para mim espiritualidade é apenas para a alma ou parte vivente de mim que não a física o que o exercício físico e nutrição equilibrada pode ser para o corpo físico. Não é a espiritualidade um fim em si, mas uma forma de  conhecer, crescer, dilatar, aprender, partilhar e ser da parte de mim que não é visível mas não menos real que o meu frágil e imperfeito corpo aparente e sujeita a leis, princípios, estrutura e lógica. Antes o trovão era milagre - e ainda é para alguns, até que se compreendeu o que sucede e porquê e ai passamos a chamar de ciência. Penso que partes do que agora é rotulado de misticismo ou paranormalidade possam ser a seu tempo identificadas, rotuladas,entendidas e encaradas com a mesma certeza, empirismo  e tranquilidade como passámos a aceitar que a terra é redonda, que o sistema solar é heliocêntrico,  evolução adaptativa das espécies, física quântica ou radioactividade.

Para mim a espiritualidade é a parte practica da crença que tenho (ai sim fé ou esperança) de que há mais do que os olhos tendem a ver ou as mãos a tocar, mas não por isso sendo algo irreal, imaginado, projectado ou mistificado. Não há milagres na acepção comum do termo, apenas ciência a operar sob princípios que porque não entendemos ainda  as leis subjacentes e lógica inerente atribuímos pendor supersticioso.

Mas isto não deixa de ser algo maravilhoso. Aprendemos os princípios e leis dos corpos celestes que em harmonia produzem a rotação da terra a volta de si mesma, a rotação elíptica em volta do sol e da viagem que – condicionados pela tracção gravitacional do sol sob os planetas ao seu redor, fazemos como um sistema solar através da orla de uma galáxia, uma de muitas em constante pulsação, rotação , atracção e afastamento.  Mas não é por isso que deixo de achar um nascer do sol belo e magestoso. Conhecer o que está por detrás dum simples nascer do sol não diminuiu para mim o seu esplendor, muito pelo contrário.

 
Espiritualidade, resumindo, é para mim a busca, a eterna peregrinação por entendimento e de experimentação , tentando ter mente aberta mas não por isso descurando de auto estima, responsabilidade social e princípios de salvaguarda do bem maior, um grau saudável de cepticismo, uma auto imposição de raciocinar por mim mesmo e uma disponibilidade e elasticidade intelectual e emocional para pensar “fora da caixa”.

A minha busca levou-me a vários livros, lugares e pessoas. A razão por detrás da maioria das minhas viagens, aliás, foi precisamente em busca de essa espiritualidade, umas vezes aprofundando  crenças pilares, outras tendo servido para desmistificar “feiticeiros de Oz”, sem temer comparar histórias em suas várias versões, cruzando com história, com geologia, física, química, psicologia, etc.  A nível de livros algo que cedo aprendi foi buscar quem coloca bibliografias idóneas, buscar a biografia do autor quando possível e confrontar com o que apregoa ( para ver se practicam e crêem mesmo ou como o caso da maioria apenas falam o que acham outros querem ouvir ou lhes convém ao ego ou carteira ou sensualidade.

Entendo então que é importante não apenas ouvir ou ler palavras que sabem bem á alma, nem tampouco descartar ou esquecer o que de bom possa aprender, mas não deusificar os autores, não me arrogar mas também não me diminuir e sempre lembrar a máxima “Pelos seus frutos os conhecereis”.

Uma coisa que nos anos recentes percebi é que há uma quantidade significativa de pessoas a interrogar-se e investigar e por em causa as religiões mais dominantes (judaísmo, cristianismo e islamismo) mas talvez porque é moda raríssimas vezes vejo pessoas questionar –ou levar a bem quando se questiona, o Budismo ou qualquer forma de religião ou flosofia oriental ou as vertentes New Age, seja o paganismo, a Wicca, alegadas canalizações espirituais de entidades amiude inventadas há menos de 100 anos,  o multidimensionalismo espirita, etc . Talvez porque amiude apelam com mensagens de diferenciação , ainda que não é por um principio ou caminho ser diferente que é real ou sequer positivo e se na realidade há um grupo e esta auto rotulado então podemos estar a sair dum  rebanho para entrar num outro apenas mais pequeno. Cada vez mais comum também é misturar teologia com ficção cientifica, apelam  a ego, apresentam soluções simplicistas e frequentemente auto-desresponsabilizadores para os problemas quotidianos.  Ideologias amiúde feitas e lideradas por pessoas com formação em psicologia ou marketing. 
Eu entendo e concordo que pode haver vantagens numa pessoa que sinta a vocação de espiritualidade muito intensa se abstrair da roda do trabalho normal quotidiano e se devotar exclusivamente ao estudo e practica  e entendo que para isso não sobreviva do ar. Mas há aqui três  pontos que acho essenciais a quem quer ingressar full time num caminho de devoção espiritual : 1- não tem de cobrar para manter luxos ( a espiritualidade não tem de arrastar a fome e ignominia mas também não pode por definição ser obscenamente epicuriana); 2- Um praticante de qualquer caminho de espiritualidade que se predispõe a pôr o que sabe em practica deve faze-lo de modo a não criar vícios psicológicos ou fobias. 3- Toda a busca por espiritualidade é oca e hipócrita senão houver compaixão em palavras e em actos; parte de seu tempo, conhecimento e recursos deve reverter para o bem estar espiritual, físico e psíquico do bem maior (exemplo doar para centros de acolhimento, ser um voluntario na rua a dar cobertores, dar comida aos famintos, não descurar responsabilidades com  a própria família, etc)
 
Buscarei porque está em mim a vontade de me esticar, porque não sai da idade dos porquês, com a mente aberta mas flanqueada pelo raciocínio próprio e livre arbítrio e o coração solicito mas não submisso, a alma sedenta mas não amordaçada.
Se em suma começámos a viagem de espiritualidade em busca de conhecimento, felicidade e compaixão e nos virmos numa situação em que parámos de querer aprender, se não nos faz felizes, se não desperta em nós compaixão igual por todas as criaturas viventes (incluindo por nós mesmos), pode estar na altura de sair da carruagem e apanhar outro comboio. O que fazemos e nos tornamos pelo caminho não pode ser uma antitese do destino que ambicionamos.

Bem hajam, seja o vosso caminho pleno de oportunidades de crescer e sem nunca esquecer que o máximo que podemos esperar de nós é viver à altura do conhecimento que nos foi dado e cada dia tentar fazer crescer essa linha de entendimento por nós próprios (plágio ou cábulas podem funcionar num teste de escola mas plágio ideológico vale anulação e repetição de teste na escola da vida) sem nunca perder de vista o objectivo comum: o Amor pelo conhecimento, o Amor por si mesmo, o Amor ou Compaixão por todas as criaturas viventes… e sorriam mais, por favor, a haver divindade ou existência alem da física, é melhor encarada- e quiçá entendida, com uma saudável dose de serenidade e boa disposição.